Aproveitei também hoje de manhã para uma m caminhada com o Vicente, que se o conta quilómetros não engana foram seis os percorridos, com partida em local não habitual, pois o Victor estava ainda fechado á hora madrugadora que iniciamos a volta, e assim quem deu hoje a partida foi o Evaristo, foi lá que «matámos o bicho». Cabe aqui dizer que o gesto do Vicente de apanhar pêra, foi só isso mesmo, o gesto, não vá o meu parente Daniel pensar que lhe fomos á pêra. Vou aproveitar para mostrar aqui um pouco de Historia da Igreja Matriz minha vizinha desde sempre, pois julgo ser o texto mais completo que existirá sobre a mesma.
Esta
Igreja Matriz de Vila Verde dos Francos teve provávelmente a sua fundação no
século XII. Ela pertenceria à Corôa, no reinado de D.Sancho I, o Povoador.
Segundo Guilherme João Carlos Henriques, ela foi visitada por um bispo de
Lisboa, antes de a Vila ter sido doada aos Gomides. Ora, estes Senhores,
reportar-se-ão a um franco Gonçalo Gomide que casou com D.Tereza Gil,
descendente do chefe franco D.Alardo Praetori. O senhorio da Vila era tomado
apenas e só por descendência dos Francos, cruzados do norte que tinham ajudado
D.Afonso Henriques na conquista de Alenquer. O filho, D.Sancho I, fez doação,
como recompensa, dessas terras, na pessoa de D.Alardo. Aquele casamento de
Gonçalo Gomide ter-se-à dado por volta de 1230 e portanto a Igreja será de data
precedente.
A Igreja
caiada de branco, deve ter sofrido diversas reformas de alteração da sua traça
original, quiça, por força dos efeitos dos terramotos de 1531 e 1755. Tem-se
conhecimento que ela beneficiou de obras feitas a expensas do Doutor Paulo de
Palácio, em 1580, que foi prior desta Igreja e de quem, mais à frente,
falaremos. A porta lateral, com o seu pórtico em arco de volta inteira, parece
fazer denotar a antiguidade desta Igreja. Também é curioso, que logo ao
transpôr esta porta, imediatamente se situa à direita, a pia de água benta,
logo, necessária e útil para os fieis se benzerem com essa água, à entrada do
templo. Julga-se que seja uma peça do século XVI. A Igreja veio a ter, passado
pouco tempo, prior e beneficiados; estes em número de seis, representados por
clérigos e pessoas influentes. O poder da Igreja aliava-se ao poder dos
Senhores, que tornaram esta Vila importante, adquirindo o estatuto de capital
de concelho, possuindo jurisdição autónoma, com órgãos administrativos e
judiciais. Os rendimentos atribuíveis aos beneficiados desta Igreja cresceram
de importância, a ponto de chegarem a ser disputados por bispos de Lisboa. Dois
terços dos benefícios iam para o prior e bispo, e o restante terço era afecto
aos outros beneficiados, que seriam estes em número de quatro. O bispo
beneficiado de maior importância, parece ter sido o cardeal arcebispo de
Lisboa, D.Jorge Costa, grande reformador, que se opunha com veemência a todas
as formas laicas e pagãs das devoções populares. Veio a falecer em Roma em
1508, estando sepultado em
Santa Maria del Populo. Na sua capela tumular figuram, num
retábulo, S. Vicente e Santo António, ladeando Santa Catarina, homónima da
Infanta D.Catarina de quem foi preceptor e que julgamos ter vindo a ser a
futura mulher de D.João III. Só muito mais tarde, por volta de 1870, é que os
rendimentos dos benefícios foram transferidos para o seminário de Santarém.
Ainda em 1750, o prior arrecadava no seu quinhão ( um terço ), o rendimento de
500$000 reis, que seria quantia avultada, se pensarmos que para acabar a
impressão da última parte da Crónica do Felicíssimo Rei D.Manuel, Damião de
Goes, pediu um empréstimo de 1000 cruzados, e a Rainha D.Catarina, ordenou que
fossem entregues ao célebre e rigoroso Cronista, a quantia de 500, isto é,
metade; e julgamos que a moeda de reis, posterior, fosse de mais valia.
Também
poderemos aquilatar da importância e poder que esta Igreja e Paróquia, tinham
nos séculos XVI e XVII, principalmente, atendendo ao prestígio e magnificência
de personalidades que nesta Igreja exerceram a função de prior. Um deles, foi o
licenciado Simão Barbosa, natural de Arrifana do Sousa e falecido,
provávelmente, na primeira metade de 1500. Outra individualidade de prestígio
foi o Doutor Paulo de Palácio, prior nesta Igreja em 1580. Espanhol, de origem,
veio para Portugal com a Rainha D.Catarina, que era filha de Filipe I de
Espanha e casou com o nosso Rei D.João III. Era doutor em Teologia, tendo sido
pregador privado do Cardeal D.Henrique. Como catedrático, escreveu obras em
castelhano, sendo de referir a Suma Caetana e dois tomos in Matheum ( o 2º tomo
não foi impresso e o original ficou no Arquivo desta Igreja. A sua biblioteca
foi deixada ao Convento da Visitação como se julga ter ficado escrito em seu
testamento de 1579. Reconstruiu a Igreja à sua custa em 1580 como já referimos,
e vem escrito na obra de Pinho Leal "Portugal Antigo e Moderno".
Faleceu em 1582 e ficou sepultado nesta Igreja. Não sabemos, ao certo, se a
quinta de Palácios, em Pereiro de Palhacana era sua, mas estamos em crer que
sim. Em 1633 foi prior D.Manuel de Noronha, figura ilustre, que viveu entre
1594 e 1671. Nasceu nesta Vila Verde dos Francos, no Palácio dos Marquezes de
Angeja, em ruínas, e era filho de D.Francisco Luiz de Noronha e Albuquerque.
Foi também prior da Castanheira e prior-mór da Ordem de S.Tiago. Chegou a bispo
de Viseu e quando designado para bispo de Coimbra, não chegou a tomar posse,
porque a morte o surprrendeu. A ele sucedeu, como prior desta Igreja de Nª Sª
dos Anjos, seu irmão D.Luis de Noronha, que faleceu em 28 de Novembro de 1643,
cuja lage sepulcral se situa debaixo do altar-mór. Em 1670 foi prior o padre
Lucas de Andrade, mas este era beneficiado da Igreja de S.Nicolau de Lisboa;
era um prelado de elevadíssima cultura geral. Em 1706 foi prior o padre José de
Matos Henriques que foi comissário da Inquisição. Por fim ainda, de referir o
padre Guilherme António da Costa, frade da Ordem de S.Francisco em Xabregas, onde
professou depois de 1830, vindo posteriormente para esta Igreja de Vila Verde
dos Francos, sendo prior em 1873.
A Igreja
de Nª Sª dos Anjos é bastante ampla, de arquitectura rectilínea mas austera. A
porta lateral voltada a sul, acusa o vestígeo de o templo ser muito antigo e
ter sofrido diversas reformas na sua construção. No exterior em posição de
rectaguarda em relação à sacristia, denotam-se nos beirais do telhado diversas
gárgulas, que são figuras grotescas trabalhadas na pedra e com veio escavado por
onde se escoam as águas pluviais da cobertura do telhado. Infelizmente foram
caiadas ou retocadas de branco, não se podendo distinguir assim a sua
configuração.
Em 1758
o altar-mór possuia além da Imagem da Padroeira , a de S.José e de S.João
Baptista. É curioso julgar-se que esta Imagem terá porventura vindo de uma
ermida que existia no antigo Castelo. No altar do lado do Evangelho existia O
Menino Jesus, S.Sebastião, Santa Luzia e Santa Anna. Do lado da Epístola, havia
nos dois altares as Imagens de Santo António, S.Marcos, Santo Antão, Nª Sª do
Rosário e S.Gregório.
Os
Marquezes de Angeja, com o seu Palácio nesta Vila, cujas Ruínas, ainda
admiramos e mereciam melhor conservação, os marquezes, diziamos, eram os juízes
perpétuos da Irmandade do Santíssimo que nessas épocas de 1600/1800 existia.
Festejavam a Festa do Santíssimo no 3º domingo de Outubro e a Festa de Nª Sª
dos Anjos em 15 de Agosto.
Presentemente
podemos observar no altar-mor uma Imagem de Nª Sª dos Anjos, que julgamos ser
uma réplica da antiga e original. No corpo da Igreja e do lado esquerdo,
patenteia-se uma bela Imagem da Imaculada Conceição e os Anjinhos; do lado
direito, observamos as Imagens de Nª Sª das Dores e de Nª Sª de Fátima.
A pia
baptismal, que se julga ser do século XVII, está junto à entrada principal do
lado esquerdo, em compartimento que se fecha e abre com um gradeamento bem
construído.
No
pavimento do altar-mór observamos do lado, quando estamos de frente para o
altar, uma lage com brasão, cuja inscrição está parcialmente destruída, mas que
por análise das palavras incompletas se julga dizer respeito a Simão Barbosa,
cujas armas serão dos Barbosas, com um escudo redondo atravessado em diagonal
por espada, em jeito de banda, no seu pano de fundo, e dentro de uma cartela oval
com laço e fivela. Do lado esquerdo, que julgaríamos tratar-se do brasão de
Luís de Noronha, parece, pelas fontes de documentação que consultamos,
tratar-se antes, mas sem confirmação, do brasão, que talvez fosse do Doutor
Paulo de Palácio. O brasão está dividido em quatro partes, no seu campo ou pano
de fundo: um castelo; uma planta; estrelas; um enxaquetado (xadrez em relevo).
Para
finalizar, referiremos apenas, e além desta Igreja, que a Capela da
Misericórdia evoca com grande devoção a Imagem do Senhor dos Passos, fazendo-se
procissão antes da Páscoa com a sua saída e encontro com Nª Sª que sai da
Igreja Matriz, e ainda há anos atrás se realizava junto da Capela do Anjo da
Guarda, à entrada da Vila, para quem vem de Alenquer, uma festa, feira e romagem
no 3º domingo de Julho.
Fontes: -Alemquer e o Seu
Concelho, de
Guilherme João Carlos Henriques - 1902.
-O Concelho de Alenquer - 1, de Profs.
António de Oliveira Melo, António Rodrigues
Guapo e Padre José Eduardo Ferreira Martins.
- Portugal Antigo e Moderno, de Pinho Leal e Carlos Nogueira
3 comentários:
Como o S.Pedro é meu amigo não preciso de me preocupar com a horta. na hora certa ele manda uns pingos que vão mantendo as coisas em ordem.
Quanto à igreja da tua «santa terrinha» estava longe de imaginar que tivesse história tão antiga e tão bem guardada. Deves sentir-te orgulhoso de lá teres sido baptizado e dado os primeiros passos na religião mais portuguesa de todas.
E o Vicente lá vai enchendo os pulmões de ar puro que, em calhando, não encontra lá nos States.
Não há vida melhor do que a do campo e o sossego também. Eu que gosto tanto do sossego, mas não tenho direito a ele, porque moro num 2º. andar, de um prédio de três andares.
Poderia dizer estou entre o céu e o inferno. Aqui não há céu, só há inferno. As pessoas só pensam no seu bem estar, e os outros que se lixem.
Tu ainda foges para a tua aldeia, agora eu que lá na aldeia onde nasci nada tenho, não tenho para onde fugir. É a vida! Aguentar e
cara alegre. Na altura que comprei, não pensei bem, e agora está sendo tarde para se mudar.
Narraste aqui a história da tua aldeia muito bem. Onde não faltam as pêras e o ninho da andorinha.
Começo de boa semana para ti, amigo Virgílio,
um abraço
Eduardo.
Aqui onde moro, ou mesmo na minha aldeia, essas pêras à beira da estrada eram devoradas mesmo verdes, não será bem a fome, mas o vício de estragar!
V.V. dos Francos, tem uma história muito rica, há que preservar esses arquivos.
Eu gosto muito da minha aldeia, mas para ir de manhã, almoçar em família e regressar à noite, aquilo é uma pasmaceira.
O meu abraço
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