segunda-feira, 5 de novembro de 2012

SONHOS OU PESADELOS?


D. Maria Ana não irá hoje ao auto-de-fé.Está de luto pelo seu irmão José,o imperador da Áustria que em pouquíssimos dias o tomaram as bexigas, verdadeiras, e morreu delas, tendo somente trinta e três anos, mas a razão porque ficará no resguardo dos aposentos não é essa, muito mal andariam os Estados quando uma rainha afracasse por esse pouco, se para tão grandes e maiores golpes são educadas.
Apesar de já ir no quinto mês, sofre de enjoos naturais, que, no entanto não bastariam a desviar-lhe a devoção e os sentidos da vista, ouvido e cheiro da solene cerimónia tão levantadeira das almas, acto tão de fé, a procissão compassada, a descansada leitura das sentenças, descaídas figuras dos condenados, as lastimosas vozes o cheiro da carne estalando quando lhe chegam as labaredas e vai pingando para as brasas a pouca gordura que sobejou do cárcere. D. Maria Ana não estará no auto-de fé porque, apesar de prenha, três vezes a sangraram, e isso foi-lhe causa de grande debilitação, em acréscimo dos afrontamentos que vinha padecendo há muitos meses. Demoram-lhe as sangrias como lhe tinham demorado a noticia da morte do irmão, que queriam os médicos segura-la mais, sendo de tão pouco tempo a gravidez. Que, em verdade os ares não andam bons no paço, como ainda agora se averiguou ao dar a el-rei um flato rijo, de que pediu confissão e logo lha deram, pelo bem que sempre faz á alma, mas terão sido marginações suas, que tudo se desatou com sucesso quando o purgaram, afinal era só a tripa empedernida.

Mas agora perguntarão que conversa é esta? se já não temos Inquisição há séculos, e portanto autos-de-fé já foi chão que deu uvas, e como diz o nosso Povo águas passadas não movem moinhos? Eu não sou  ateu, e portanto mesmo que auto-de fé houvesse em princípio não era um dos requisitados para a fogueira, então a que despropósito vem este trecho do livro aqui fazer?
Pois tudo isto é verdade, mas é que esta noite tive um pesadelo, esquisito, e que julgo terá a ver com este capitulo do livro de Saramago "Memorial do Convento" que tinha acabado de ler, entretanto fui para o vale de lençóis e foi uma coisa horrível! Os carrascos que me apareciam no sonho, eram o Passos Coelho e Victor Gaspar, a cena passava-se precisamente no local da narrativa do livro que tinha acabado de ler, isto é, em pleno Rossio, eles gritavam que queriam acabar com os Velhos, que só lhe dão despesas e nada de útil fazem, são remédios caríssimos, as operações a´próstata que estão pela hora da morte, as fraldas que agora os velhos até usam este adereço, são os asilos, as pensões milionárias que recebem, e o País não suporta isso, há que acabar com a raça rapidamente, eu gritava que estava inocente, que não tomava remédios, a próstata tirando a coisa de mijar muita vez, ainda estava para as curvas, não estava em nenhum asilo, e que também não tinha uma pensão milionária, mas qual quê, os gajos com mais de 65 anos tinham de acabar, para dar lugar aos novos.

Os Jovens já os mandamos imigrar, diziam eles, mas aos velhos não os podemos mandar trabalhar, pois queixam-se das artroses do reumático, da vista cansada, tretas, eles querem é viver á custa do Estado, e como para grandes males grandes remédios, vamos limpar.-lhes o sebo, usando este método mais limpo, e dispensando o dispendioso funeral, aliás já cortamos os subsídios aos mesmos e continuamos falidos, e dito isto atearam a fogueira, eu gritava que me estavam a queimar, que não aguentava tanto calor, mas nessa altura aparece um gajo que é banqueiro, e que tem um nome estrangeirado, acho que  Ulrich, me dizia, aguentas mais, ai aguentas, e o fogo a lavrar cada vez com mais intensidade, e eu a dizer não aguento mais, e o gajo ai aguentas, aguentas, e nesta altura acordei do pesadelo, e verifiquei que Portugal continua pacifico, diria até amolecido, não fora a tia Manuela, e os tios Bagão Félix e Marcelo irem animando as hostes.

Mas já que o pesadelo terminou, e como estou com a mão na massa, quero trazer aqui o último condenado á fogueira pela Inquisição Portuguesa, trata-se do Padre Gabriel Malagrida, nascido em Itália em 1689, fez-se Padre e veio para Portugal em 1720, daqui fez algumas viagens ao Brasil em missões de evangelização, até se instalar definitivamente em Lisboa em 1754.
Foi preso em 1758 com outros Jesuítas como cúmplice do atentado contra D. José ( Ó Marquês de Pombal, tivestes alguma coisa a ver com a prisão do Padre?) e entregue ao Tribunal da Inquisição para ser julgado por erros da fé, em virtude da sentença do mesmo tribunal de Setembro de 1761, morreu estrangulado e queimado no auto-de fé celebrado no dia 20 deste  Mês no Rossio.






















3 comentários:

Valdemar Alves disse...

Um tratado de prosa... Gostei!

Edum@nes disse...

Ao ponto que tu chegaste. Tal é a raiva que lhes tens. Não és só tu também eu, mas com uma pequena diferença. Enquanto tu sonhas com eles aos gritos no Rossio. Eu ainda não cheguei lá. Bandidos, então sempre é verdade tudo aquilo que eu tenho pensado deles!...Aquela porca feia e velha "infornicável" ninguém quer correr com ela de lá para fora. Até o Coelho e o Vítor, andam aos beijinho a ela? Amigo tem cuido com esses sonhos e pesadelos! Será que a rapaziada os deixa lá estar até ao fim da comissão? Se eles continuarem a reunir durante a noite, teremos que lhes montar uma emboscada. Será a única maneira de nos vermos livres deles? Contratamos um Marinheiro da Polícia Marítima com uma lancha Super rápida para os levar aos tubarões! Mesmo assim é perigoso para a saúde dos animais-marinhos. Porque
carne envenenada os pode matar!

Boa noite para ti, amigo Virgílio,
um abraço
Eduardo.

Tintinaine disse...

Ninguém leu aquela entrevista publicada pelo jornal «O Crime» sobre o "Braço-Armado"?
Está em marcha o plano para acabar com os teus pesadelos!